Após primeiro ano de pouca conversa direta com movimentos
sociais e de governo ter ajudado a criar clima 'anti-ONGs', presidenta começa
2012 disposta a ter nova postura. Caso Pinheirinho foi aproveitado pelo governo
para sinalizar inflexão e relação diferenciada com movimentos. Prevista para
março, proposta de nova regra de repasse a ONGs manterá financiamento público.
Brasília – A presidenta Dilma Rousseff acredita que ela
e o governo “exageraram” no rigor com movimentos sociais no ano passado e quer
remediar a situação em 2012. Menos afeita do que o antecessor a conversar
diretamente com os movimentos, Dilma está disposta a tentar abrir-se mais daqui
para frente. E não pretende mais colaborar com a demonização deles pelo governo,
como aconteceu em 2011 a partir de escândalos a envolver organizações
não-governamentais (ONGs).
O primeiro gesto individual da presidenta para tentar
melhorar a relação dela com os movimentos foi ter feito uma reunião fechada com
cerca de 90 representantes de 35 entidades, durante a passagem dela pelo Fórum
Social Temático, em Porto Alegre, no dia 26 de janeiro.
A reunião foi planejada, segundo fonte do Palácio do
Planalto que conversou com a reportagem, para que Dilma ouvisse e os movimentos
pudessem falar à vontade. E não apenas a respeito do tema que, em tese, era o
foco do encontro, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento
Sustentável, a Rio+20, que o Brasil sediará em junho. Mas de tudo.
Pela biografia diferente da do ex-presidente Lula e por
estar se acostumando ao cargo, em 2011, Dilma negociou pouco frente a frente com
os movimentos, o que irritou líderes de centrais sindicais e entidades
campesinas, por exemplo. Para eles, a presidenta preferia sentar e escutar o
empresariado.
Como a reunião de Dilma com os movimentos, em um hotel de
Porto Alegre, era a aberta a qualquer tema, a presidenta teve a chance de pela
primeira vez comentar com gente de fora do governo, mesmo que a portas fechadas,
a violenta ação de despejo contra sem-teto em São José dos Campos, que ela
chamou de “barbárie”.
O caso Pinheirinho, aliás, está sendo aproveitado pelo
governo para mostrar aos movimentos que ele ainda são, sim, aliados. Por isso,
desde a primeira hora pós-despejo, o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria
Geral da Presidência) deu declarações que buscam demarcar a diferença (para ele,
“de método”) na forma como o governo lida com os movimentos, comparado ao
PSDB.
Verba a ONGs Principal interlocutor de Dilma e do
governo perante os movimentos sociais, Carvalho também tem a responsabilidade de
tentar desatar um nó, apertado demais com ajuda do próprio governo, na relação
com os movimentos. É a revisão da legislação das ONGs, processo que envolve
diversos ministérios, mas que está sob comando da Secretaria Geral.
No ano passado, as ONGs tornaram-se vilãs nacionais por
causa de denúncias jornalísticas de corrupção que custariam o cargo de uma série
de ministros.
Foi assim no Esporte, no Trabalho e no Turismo, por exemplo, todos
envolvidos em acusações de que o repasse de verba para ONGs era uma forma de
desviar dinheiro público.
Os episódios levaram Dilma a baixar decretos draconianos
sobre transferência de verba para ONGs e a pedir à equipe que preparasse novas
regras.
O clima anti-ONGs dentro do governo e de suspeição geral
contra essas entidades na imprensa deu origem a situações em que, segundo um
colaborador direto de Dilma, claramente “nós exageramos”.
O melhor exemplo do “exagero”, de acordo com esta mesma
fonte, talvez tenha sido a recusa do ministério do Desenvolvimento Social de
firmar convênio de construção de 750 mil cisternas no Nordeste com uma conhecida
e poderosa entidade da região, a Articulação do Semi-Árido (ASA).
A ministra Tereza Campello teve receio de que o contrato,
por sua dimensão, um dia se voltasse contra ela e evitou autorizá-lo.
A ASA reagiu à postura do governo com um grande protesto
em dezembro, para o qual conseguiu mobilizar cerca de 15 mil pessoas em pleno
sertão nordestino, a ponto inclusive de bloquear uma ponte importante que liga
Juazeiro (BA) a Petrolina (PE).
Um dia depois da reunião de Dilma com os movimentos
sociais em Porto Alegre, a Fundação Banco do Brasil divulgou edital para
contratar fornecedores de um primeiro lote de 60 mil cisternas, numa licitação
que se encerrará dia 27 de fevereiro.
Coordenadora do processo de revisão da legislação das
ONGs, a Secretaria Geral deve concluir uma proposta em março. As linhas gerais
foram apresentadas a “ongueiros” durante o Fórum Social Temático, em Porto
Alegre.
Segundo Gilberto Carvalho, a proposta vai manter a
previsão de financiamento público das ONGs, ou seja, o governo não vai acabar
com os convênios. (ASA Brasil). |
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